Tinha esperado o dia inteiro por aquele momento. Abriu as meias novas, vestiu o vestido listrado com cuidado para não amassar. Calçou as sandálias de salto alto vermelho e ao olhar-se no espelho, pensou com carinho nos amigos que encontraria logo mais.
Demorou a fechar a porta da casa antiga que sempre enganchava. Depois de xingar Deus, o mundo e a situação financeira atual que não lhe possibilitava pagar um taxi, pôs-se a andar fazendo barulho.
Uma rua, duas, três... e já não aguentava mais. Não por estar andando. Estava e muito acostumada a gastar solas de sapato. No entanto, salto e principalmente salto alto não faziam parte de seu look cotidiano.
Deu mais alguns passos. Resolveu parar. Seu tornozelo estava em carne viva. Mais a frente viu uma placa. Esfregou os olhos como que para se certificar que não era miragem.
Farmácia. Foi o que lhe encheu os olhos. Juntou forças e mancando chegou ao oásis. Antes de conseguir pedir o band aid, um homem de jaqueta lhe atravessou e fez o pedido pela grade de segurança que protegia a porta.
O farmaceutico já entregava o pedido quando o homem perguntou se havia troco para vinte. A garota do band aid revirou os olhos de dor e assustou-se com a pergunta do farmaceutico:
- Ele deixou a moto ligada? Você viu a placa?
- Não... nem vi nada...
- Aquele rapaz tem assaltado toda a vinzinhança com esse golpe.Pede troco,pega e vai embora. Já fez isso comigo , mas agora não consegue mais me enganar. Gostaria de ter visto a placa da moto...
- Moço me dá um band aid
Ele prontamente pegou o curativo e prosseguiu a conversa sobre os assaltos enquanto ela colava o adesivo no tornozelo.
- E você cuidado viu?
- Tá.
Saiu com sua compra de quarenta centavos colada no pé continuando a mancar. Entre um toc toc e outro do salto pensou que ficaria muito feliz se o ladrão enjaquetado lhe levasse o maldito sapato.
quarta-feira, 30 de setembro de 2009
segunda-feira, 21 de setembro de 2009
Infeliz Cotidiano.
Sílvio acordou pela manhã já em cima do horário.Calçou os chinelos,usou o sanitário e acionou a descarga.Seguiu até a pia,abriu a torneira e a água fria lavou-lhe as mãos castigadas pelo tempo.Colocou o creme dental na escova,porém preferiu se barbear antes.Assim,poderia abrir a torneira só mais uma vez:as contas de água estavam vindo bastante altas e seu orçamento estava limitado.Secou-se com a toalha que há dias não lavava, penteou os cabelos e vestiu-se adequadamente para mais um dia de trabalho.Antes de sair do quarto,averigou se havia pegado tudo:carteira,caneta,chaves,lenço,relógio,maço de cigarros.Como ele não gostava de se sentir desatualizado,principalmente em relação a Economia Mundial,o jornal o "aguardava" pronto para ser lido na mesa do café-da-manhã.Lembrou-se dos afazeres do dia,os escreveu em um guardanapo que estava ao seu alcance e partiu com a pasta e os quadros debaixo do braço.Dentro do carro,acendeu um cigarro para não se estressar com o trânsito congestionado daquele horário.
No antigo escritório, a correria de todo dia: o telefone que não pára de tocar;as contas que não param de chegar;um monte de pápeis que o aguardam para serem lidos antes de serem assinados;quadros que ainda precisam ser vendidos;a velha secretaria Maria com seu bloco de notas que não dá uma pausa entre uma frase e outra.Quando ela começou a trabalhar ali,era uma bela moça com um bonito par de pernas.Hoje,uma velha que não vê a hora de acabar o serviço e encerrar o expediente. As paredes,que há tempos precisavam de uma pintura,ainda guarda lembranças de uma época que tudo eram "flores" e os negócios iam de "vento e polpa".Como sentiam saudades desse passado!
Sílvio olhou ao seu redor.Respirou fundo.Acendeu outro cigarro.Maria resolvera calar-se e serviu-lhe café.Pegou a xícara,deixou a bandeja de lado.O dia seria,mais uma vez,longo.Seus cigarros,sua companhia.
terça-feira, 8 de setembro de 2009
O banho de mar.
Havia dias que a menina queria sair da rotina e ver o mar.
Começou a planejar em casa com alguns parentes, chamou o namorado, juntaram os trapos e partiram em direção ao litoral. O caminho até o lugar em que iam ficar hospedados já mostrou logo de início as maravilhas que estavam reservadas para eles. Água-de-côco, sombra, rede, cervejinha, sol, protetor solar, mariscos...não havia nada melhor.
O dia de passeio começou logo cedo e foi aquele corre-corre típico de quem não quer perder um minuto. Cadê meu bíquine? Alguém viu minha toalha? Todo mundo já tomou café-da-manhã? Estão todos prontos? Enfim, tudo certo no carro, partiram..
Na praia, aquela alegria!
A menina tirou o short, a camiseta, os óculos escuros e, como se tivesse sido chamada por uma força mística, correu em direção à água, dando aquele mergulho gostoso. Era como se o mar pudesse lhe "lavar a alma". As energias ruins acumuladas ao longo do tempo, com atitudes e pensamentos pessimistas, eram levadas pelas àguas a cada onda.
Entre mergulhos e banhos de sol, lá veio aquele momento também esperado: "Chefia! Pode nos trazer uma cervejinha, catadinho siri e uma dúzia de lambretas?" As emoções da menina davam piruetas em seu corpo.
Só se sentia assim duas vezes ao ano, se não uma: quando ia à praia.
Quando o sol começou a ir embora, era a hora de todos se despedirem. Não adiantou choro, nem lamento. Deu a hora, tinham que ir.
Em casa, depois de um banho quente demorado, a menina jantou, escovou os dentes e foi se deitar. Em sua oração antes de dormir, apenas agradeceu por tudo.
No litoral não se sentia adulta. A criança não parecia ter crescido.
Era a pureza da lembrança de quando era menor? Era o mar? Era a felicidade sentida de uma maneira diferente de quando está longe dali? Não soube a resposta. Mas eu sei: ali, como todas às vezes, ela se permitiu viver.
Começou a planejar em casa com alguns parentes, chamou o namorado, juntaram os trapos e partiram em direção ao litoral. O caminho até o lugar em que iam ficar hospedados já mostrou logo de início as maravilhas que estavam reservadas para eles. Água-de-côco, sombra, rede, cervejinha, sol, protetor solar, mariscos...não havia nada melhor.
O dia de passeio começou logo cedo e foi aquele corre-corre típico de quem não quer perder um minuto. Cadê meu bíquine? Alguém viu minha toalha? Todo mundo já tomou café-da-manhã? Estão todos prontos? Enfim, tudo certo no carro, partiram..
Na praia, aquela alegria!
A menina tirou o short, a camiseta, os óculos escuros e, como se tivesse sido chamada por uma força mística, correu em direção à água, dando aquele mergulho gostoso. Era como se o mar pudesse lhe "lavar a alma". As energias ruins acumuladas ao longo do tempo, com atitudes e pensamentos pessimistas, eram levadas pelas àguas a cada onda.
Entre mergulhos e banhos de sol, lá veio aquele momento também esperado: "Chefia! Pode nos trazer uma cervejinha, catadinho siri e uma dúzia de lambretas?" As emoções da menina davam piruetas em seu corpo.
Só se sentia assim duas vezes ao ano, se não uma: quando ia à praia.
Quando o sol começou a ir embora, era a hora de todos se despedirem. Não adiantou choro, nem lamento. Deu a hora, tinham que ir.
Em casa, depois de um banho quente demorado, a menina jantou, escovou os dentes e foi se deitar. Em sua oração antes de dormir, apenas agradeceu por tudo.
No litoral não se sentia adulta. A criança não parecia ter crescido.
Era a pureza da lembrança de quando era menor? Era o mar? Era a felicidade sentida de uma maneira diferente de quando está longe dali? Não soube a resposta. Mas eu sei: ali, como todas às vezes, ela se permitiu viver.
segunda-feira, 7 de setembro de 2009
Promessas de segunda
Segunda-feira. Engraçado, nada foi prometido. Talvez por ser feriado e ela estar se sentindo como em um domingo, onde tudo é permitido, onde tudo pode ser adiado ou, até mesmo, por ter cansado de prometer...prometer...prometer!
Estava deitada ali no sofá de qualquer jeito, acabara de tirar o uniforme e ficara apenas de calcinha e sutiã. Odiava trabalhar em feriados! Tinha tantas coisas ainda para fazer mas, ficou ali, inerte. Não queria fazer nada, não queria se comprometer com exatamente nada.... não desejava lembrar de suas juras e principalmente de seus débitos com elas.
Todas suas promessas eram assim: Ah... na próxima segunda! Exceto no fim de ano, já que nem sempre a virada coincide com esse célebre dia. Agora ela pensa: Quantas desses contratos com o seu próprio ego foram cumpridos? Emagrecer, começar a malhar, se dedicar mais aos estudos, ser mais organizada, dormir menos, dormir mais, enfim, para quê sobrecarregar tanto a segunda-feira? Por que não a quarta? A sexta? Ou talvez o domingo! Não é ele o primeiro dia da semana?
Estava deitada ali no sofá de qualquer jeito, acabara de tirar o uniforme e ficara apenas de calcinha e sutiã. Odiava trabalhar em feriados! Tinha tantas coisas ainda para fazer mas, ficou ali, inerte. Não queria fazer nada, não queria se comprometer com exatamente nada.... não desejava lembrar de suas juras e principalmente de seus débitos com elas.
Todas suas promessas eram assim: Ah... na próxima segunda! Exceto no fim de ano, já que nem sempre a virada coincide com esse célebre dia. Agora ela pensa: Quantas desses contratos com o seu próprio ego foram cumpridos? Emagrecer, começar a malhar, se dedicar mais aos estudos, ser mais organizada, dormir menos, dormir mais, enfim, para quê sobrecarregar tanto a segunda-feira? Por que não a quarta? A sexta? Ou talvez o domingo! Não é ele o primeiro dia da semana?
Por fim ela promete esquecer dessas promessas de segunda. Ops! Esta aí mais uma promessa e em plena segunda-feira! Então ela aguarda, afinal, já é quase terça. Quem sabe nesse dia seus pactos surtam mais efeito.
quarta-feira, 2 de setembro de 2009
Mais um na multidão
Conheci uma pessoa. Ou melhor, não conheci. Mas de qualquer forma, acho que isso não faz muita diferença no final das contas.
Estava esperando o ônibus de manhã assim como eu. Uma das poucas coisas boas de usar transporte coletivo, além de todo lenga lenga ambiental, é observar as pessoas. E devidamente protegida, é claro. Penso que uma das principais funções dos óculos escuros é exatamente essa: transportar você para uma espécie de "bolha" onde se pode observar a tudo e ainda se sentir invisível. Meio infantil, sei. Mas não deixa de ter um pouco de verdade.
Mas voltando ao caso... ônibus... óculos... o menino. Bem, lá estava ele com aquela cara de quem espera ônibus. A mesma daquela que todo mundo faz no elevador. Tipo "cara de paisagem" até aí nem tem nada demais. Na verdade, pensando agora, acho que o caso inteiro não tem nada demais. Só um menino com cara de paisagem que esperava o ônibus como todo mundo. Mas o que me chamou atenção nele foi o fato de achar que ele também tinha uma bolha. Só que ele tinha esquecido seu óculos em casa. Ou talvez tenha quebrado. Ou nem tenha. Sei lá. Só sei que eu estava invisível e ele não.
Pode ser que ele estivesse desejando meus óculos para ficar oculto na multidão também. Ou pode ser que eu esteja ficando doida, imaginando alguma relação entre um menino desconhecido, bolhas, óculos escuros, ônibus, ficar invisível, logo pela manhã. Ou não.
O que sei é que esses lugares com muitas pessoas fazem a gente divagar demais. Tenho que parar de tomar café e ficar com mais sono pela manhã.
Estava esperando o ônibus de manhã assim como eu. Uma das poucas coisas boas de usar transporte coletivo, além de todo lenga lenga ambiental, é observar as pessoas. E devidamente protegida, é claro. Penso que uma das principais funções dos óculos escuros é exatamente essa: transportar você para uma espécie de "bolha" onde se pode observar a tudo e ainda se sentir invisível. Meio infantil, sei. Mas não deixa de ter um pouco de verdade.
Mas voltando ao caso... ônibus... óculos... o menino. Bem, lá estava ele com aquela cara de quem espera ônibus. A mesma daquela que todo mundo faz no elevador. Tipo "cara de paisagem" até aí nem tem nada demais. Na verdade, pensando agora, acho que o caso inteiro não tem nada demais. Só um menino com cara de paisagem que esperava o ônibus como todo mundo. Mas o que me chamou atenção nele foi o fato de achar que ele também tinha uma bolha. Só que ele tinha esquecido seu óculos em casa. Ou talvez tenha quebrado. Ou nem tenha. Sei lá. Só sei que eu estava invisível e ele não.
Pode ser que ele estivesse desejando meus óculos para ficar oculto na multidão também. Ou pode ser que eu esteja ficando doida, imaginando alguma relação entre um menino desconhecido, bolhas, óculos escuros, ônibus, ficar invisível, logo pela manhã. Ou não.
O que sei é que esses lugares com muitas pessoas fazem a gente divagar demais. Tenho que parar de tomar café e ficar com mais sono pela manhã.
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